O mundo seria mais pacífico se fosse governado por mulheres? Um novo e
estimulante livro, do psicólogo da Universidade Harvard Steven Pinker,
diz que sim. Em The Better Angels of Our Nature ("Os melhores anjos de
nossa natureza", em tradução livre), ele apresenta dados mostrando que a
violência humana, embora ainda excessiva nos dias atuais, vem
declinando gradativamente. Além disso, ele afirma, "ao longo da
história, as mulheres têm sido e serão uma força pacificadora".
A guerra tradicional é um jogo masculino: as mulheres tribais nunca
se reuniram em bandos para atacar tribos vizinhas. Como mães, elas têm
incentivos para manter condições pacíficas para nutrir sua prole e
garantir que seus genes sobrevivam na geração seguinte.
Os incrédulos imediatamente responderão que as mulheres não travaram
uma guerra simplesmente porque raramente tiveram posições de poder. Se
tivessem assumido cargos de liderança, as condições existentes num mundo
anárquico as obrigariam a adotar as mesmas decisões belicosas que os
homens. Margaret Thatcher, Golda Meir e Indira Gandhi foram mulheres
poderosas e todas levaram seus países à guerra. Mas é verdade também que
essas mulheres chegaram à liderança agindo conforme as regras políticas
do "mundo dos homens". Elas conseguiram se adequar aos valores
masculinos, o que permitiu sua ascensão à liderança. Num mundo em que as
mulheres assumiram a metade das posições de liderança, elas devem se
comportar de modo diferente no poder.
E então, surge uma questão mais ampla: gênero é realmente importante
na liderança? Em termos de estereótipos, vários estudos psicológicos
mostram que os homens tendem a preferir o poder duro do comando, ao
passo que as mulheres são mais colaboradoras e intuitivamente
compreendem o poder brando da atração e da persuasão. Os americanos
costumam descrever liderança usando estereótipos masculinos fortes, mas
estudos recentes mostram um sucesso crescente do que antes era
considerado um "estilo feminino".
Nas sociedades com base em informação, as redes vêm substituindo as
hierarquias e os trabalhadores intelectuais são menos submissos. E em
muitas organizações a administração vem mudando no sentido da "liderança
compartilhada" e uma "liderança dividida", com os líderes no centro de
um círculo e não mais no topo de uma pirâmide. O antigo CEO do Google,
Eric Schmidt, dizia que precisava "afagar" seus funcionários.
Estímulo. O ex-presidente George W. Bush definiu seu papel como
"daquele que decide", mas a moderna liderança é muito mais do que isso.
Hoje o líder tem de ser capaz de usar as redes, colaborar e estimular a
participação. O estilo não hierárquico das mulheres e a sua capacidade
de relacionamento ajustam-se mais a uma liderança que agora é necessária
neste novo mundo das organizações e grupos com base em conhecimento. E
os homens, em média, estão menos preparados para oferecer.
No passado, quando as mulheres tinham de abrir à força o caminho para
chegar ao topo das organizações, elas precisavam adotar um "estilo
masculino", contrariando a norma social da "gentileza" feminina. Mas
hoje, com a revolução da informação e a democratização exigindo uma
liderança mais participativa, o "estilo feminino" tem se tornado um
caminho para se atingir uma liderança mais eficaz. Para ter sucesso como
líderes, homens não só terão de avaliar o estilo de suas colegas
mulheres, mas usar com maestria aquelas mesmas habilidades.
Esta é uma tendência, não (ainda) um fato. Ainda há poucas mulheres
em posições de liderança, e elas ainda detêm apenas 5% dos cargos no
alto escalão das empresas e uma minoria de postos legislativos (somente
16% nos EUA, por exemplo, em comparação com 45% na Suécia). Num estudo
feito com 1.941 dirigentes de países independentes, no século 20, foram
encontradas apenas 27 mulheres, e cerca da metade delas chegou ao poder
na qualidade de viúvas ou filhas de um governante. Ainda no século 20,
menos de 1% dos líderes eram mulheres que chegaram ao poder por seu
próprio esforço.
Assim, diante do novo conceito mencionado nos estudos sobre
liderança, no sentido de que a entrada na era da informação significou
entrar no mundo feminino, por que as mulheres não têm um melhor
desempenho? Falta de experiência, as responsabilidades familiares em
primeiro lugar, um comportamento caracterizado pela busca do acordo, e a
antiga e flagrante discriminação, tudo isso ajuda a explicar esta
defasagem.
Os caminhos exigidos para uma ascensão profissional e as normas
culturais que os criaram e reforçaram não permitiram às mulheres
adquirir os talentos exigidos para posições de alto escalão em muitas
organizações.
Pesquisas mostram que mesmo nas sociedades democráticas as mulheres
enfrentam um risco social maior do que os homens quando tentam negociar,
por exemplo, um aumento na sua remuneração. As mulheres em geral não
estão bem integradas nas redes masculinas que dominam as organizações, e
os estereótipos de gênero ainda prejudicam aquelas que tentam vencer as
barreiras.
Essa tendência começa a desaparecer nas sociedades com base em
informação, mas é um erro identificar o novo tipo de liderança que
necessitamos nesta era da informação simplesmente como "o mundo da
mulher". Mesmo positivos, os estereótipos são péssimos para mulheres,
homens e uma liderança eficaz.
Os líderes devem ser vistos menos em termos de comando heroico e mais
no sentido de alguém que estimula a participação dentro de uma
organização, grupo, país ou rede. Questões envolvendo o estilo
apropriado - ou seja, quando adotar maneiras mais duras ou mais brandas -
também são importantes para os homens e para as mulheres, e isso não
deve ser ofuscado pelos tradicionais estereótipos de gênero.
Em algumas circunstâncias, os homens terão de agir mais "como
mulheres", em outros as mulheres necessitarão ser mais "como homens".
Decisões cruciais sobre guerra e paz no nosso futuro dependerão não
do gênero, mas de como os líderes combinarão os poderes duro e brando
para criar estratégias inteligentes. Homens e mulheres é que tomarão
essas decisões. Mas é provável que Pinker esteja certo quando observa
que as regiões do mundo em que a violência não diminuiu também são
regiões atrasadas no sentido da delegação de poderes para as mulheres. /
TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA
* JOSEPH S., NYE, PROJECT SYNDICATE, É EX-SECRETÁRIO ADJUNTO DA DEFESA DOS EUA, PROFESSOR EM HARVARD
Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,quando-as--mulheres-lideram-,834744,0.htm