14 de outubro de 2011

Zimbabué: Mulheres libertam-se online num país conservador como Zimbabué


Num país descrito em grande parte como conservador, onde relembram constantemente às mulheres o seu lugar dizendo-lhes o que devem discutir abertamente ou o que não podem, numa sociedade que muitos vêem como parada no tempo, a Internet tem oferecido uma plataforma valiosa para a discussão de temas que de outra forma permaneceriam tabus. Afinal de contas, isto é o Zimbabué, onde o presidente é conhecido mundialmente pelos seus fortes pontos de vista contra assuntos como a homossexualidade.
Mulheres blogueiras e utilizadoras do Facebook aproveitaram estas plataformas para discutirem temas relacionados com a sua sexualidade e com tudo aquilo que faria corar, sem dúvida, o Presidente Mugabe. Elas criaram tudo nestas plataformas, desde as suas próprias bases informáticas chamadas de ”tias agonizantes” até à desfragmentação do papel das mulheres na política e na economia.
A Internet tem oferecido plataformas valiosas para a discussão de questões que são comumente consideradas tabus. Fonte da foto: página do Facebook da Makhox Women's League.
A bloguer Delta Ndou [en] descreve o seu blogue como espaço para ”reflexões de uma feminista”, e, tratando-se do Zimbabué, podemos considerar esta afirmação audaciosa. Ndou tornou-se de alguma maneira uma celebridade da Internet graças ao seu blogue, onde escreve sobre qualquer coisa desde o teste de Papanicolau, passando pelo casamento, pelo sexo e sem esquecer as mulheres que traem os maridos. Numa publicação intitulada “O exemplo de Hillary” [en], Ndou debate o futuro da Secretária de Estado Americana Hillary Clinton e como esta lidou com o escândalo envolvendo Bill Clinton e Monica Lewinsky.
 Num dos textos publicados no blog, Ndou escreve sobre o Papanicolau:
I mean if women can sit through a 5 hour hair-braiding session; and the time we sacrifice towards looking good in salons – we can actually spare a few hours for our cervixes to get inspected. For the record, having done the pap-smear; I am not expected to show up for another one until after 2 years so the convenience and peace of mind was worth the experience. Do yourself a favor… if it means wearing a disguise, traveling to another city where no one knows you or whatever – get a pap-smear.
Quero dizer, se uma mulher consegue ficar cinco horas sentada a arranjar o cabelo; fora o tempo que sacrificamos para ficarmos bonitas - podemos então gastar algumas horas para que nos inspeccionem o cérvix. Para que conste, depois de feito o Papanicolau só devo repetir o exame daqui a dois anos portanto a vantagem e a paz espírito valeram a experiência. Faça um favor a si mesma…se para fazer este teste significa ter de disfarçar-se,  de viajar para outra cidade onde ninguém a conhece ou seja lá o que for - certifique-se que faz o teste de Papanicolau.
São coisas deste género que trouxeram popularidade ao blogue. Ela continua:
You need it and it’s free. While issues like male circumcision have enjoyed much prominence in media coverage; the need for pap-smear testing remains a very obscured but pressing health care issue. So this article is a modest contribution to address this oversight. Men go and get circumcised. Women go and get a pap-smear.
O exame é gratuito e você precisa dele. A circuncisão masculina tem sido alvo de destaque nos meios de comunicação; a necessidade do Papanicolau tem estado à sombra embora seja um assunto premente. Por isso este artigo é uma contribuição modesta para a resolução deste descuido. Homens, vão circuncisar-se. Mulheres, vão fazer o teste de Papanicolau.
Ela não é a única a dizer online o que lhe vai na cabeça. A bloguer Fungai Machirori leva o “discurso feminista” a um nível mais alto. Machirori escreve sobre vaginas e tudo o que provoque “choque e pavor” às pessoas normais do Zimbabué e é a sua escrita que define a essência dos blogues: liberdade de expressão.
Numa das suas publicações Machirori pergunta sem pudores, “Que aspecto tem a vagina?” [en]:
Qual é o aspecto “normal” de uma vagina?
What does a ‘normal’ vagina look like?
This might be a startling question for you, but when you really think about it, it is quite valid.
They come in all shapes and colours, but we never dare investigate…
Unlike men who know about average inches and centimetres for their appendages, we women don’t really know much about our sexual organs…
We women rarely look at our own vaginas, let alone anyone else’s – so how should we know?! Unlike men who have to interact with their penises each time they urinate or change their underwear, we women hardly ever pay attention to our vaginas. Besides, it’s not like it’s easy to get them in full view anyway. Mirrors and strange positions are required and this just adds to the awkwardness of trying to become knowledgebale about your own body.
And sadly, the only time many young women become aware about the appearance of the vagina is when they are forced to alter it from its own natural state.
Esta pergunta pode ser surpreendente mas se pensarmos mesmo sobre isto, veremos que é uma pergunta válida.
Há vaginas de todos os formatos e cores, mas nunca nos atrevemos a investigar…
Ao contrário dos homens que sabem todos os detalhes e centímetros dos seus apêndices, nós mulheres não sabemos muito acerca dos nossos orgãos sexuais…
Nós mulheres raramente olhamos para as nossas vaginas, quanto mais para as vaginas das outras - portanto como as poderíamos conhecer? Ao contrário dos homens que têm de interagir com os seus pénis cada vez que urinam ou que trocam a roupa interior, nós mulheres raramente prestamos atenção às nossas vaginas. Além disso, não é propriamente fácil vê-las. Exigem-se espelhos e posições estranhas e a isto acrescenta-se a estranheza de tentar ter conhecimentos sobre o próprio corpo.
E infelizmente, a única vez em que as mulheres jovens tomam consciência da aparência das suas vaginas dá-se quando são forçadas a mudá-la a partir do seu estado natural.
A bloguer Shonavixen [en] começou recentemente um desafio bloguista de 30 dias que será indubitavelmente considerado pelos seus companheiros internautas como uma produção prodigiosa.
O Facebook não passou despercebido às mulheres que criaram o seu próprio grupo chamadoMakhox Women's League.
As publicações são escritas geralmente em SiNdebele, língua local e isto talvez seja um indicador de que a utilização das línguas locais para dar voz e espaço a tudo começa a ganhar terreno na cyber esfera. É aqui que as mulheres trocam de papéis como “tias agonizantes ” e “em agonia”, e estas trocas nâo têm preço. Este grupo tenta utilizar este espaço através de expressões pessoais que a media convencional falhou em preencher e que por natureza das trocas entre os membros, nunca veriam a luz do dia “num jornal familiar”.
Pode ler-se [en] o último tópico na página do grupo: 
What are the disadvantages of being a stepmom or are there any advantages or something you've seen either good or bad…. Let's share makhosikazi. RM.
Quais são as desvantagens de ser-se madrasta ou existem vantagens ou qualquer coisa que se tenha visto de bom ou de mau. Vamos partilhar makhosikazi. RM.
O Facebook tem-se tornado, de facto, ponto de encontro para o debate de temas “tabu” entre as mulheres do Zimbabué. Numa das suas publicações, Machirori fala sobre mulheres que namoram homens mais novos e algumas mulheres levam este discurso para aquela que é verdadeiramente a maior rede social do mundo, o Facebook.
Machiroriquestiona [en]: “Se as mulheres do Zimbabué no Facebook dizem que não se importam de sair com homens mais novos, será possível que as coisas estejam a mudar?”
Isto é particularmente interessante porque é um tópico em que a sociedade do Zimbabuense não aceitaria debater abertamente, mas claro, espera-se que os homens casem com mulheres bem mais jovens! Talvez estas bloguers feministas estejam a expôr as inconsistências através do único canal de que dispõem: a blogoesfera e o Facebook.
São tempos de mudança concretas, como cantava Bob Dylan. E graças à Internet e ao aumento da presença de mulheres na rede.